ENSINO DE HISTÓRIA-ONDE ESTÁ O NEGRO NA HISTÓRIA?
Atila Silva Sena Guimarães
Mnt. ProfHistória /UNEB
Existe uma lacuna histórica que deve ser preenchida referente à participação do negro na História. No ensino de História e em seus compêndios didáticos pouco se percebe o protagonismo negro afro-brasileiro perpassando a ideia incoerente de que estes são passivos como agentes históricos. Em contrapartida ainda se reservas capítulos falando da escravidão e como esta foi cruel para os negros evidenciando uma suposta fragilidade e impotência dessa etnia diante das mazelas sofridas. Nas melhores das hipóteses traz uma abordagem cultural. No que tange ao restante dos conteúdos selecionados com ênfase em aspectos políticos, econômicos e sociais os afro-brasileiros são esquecidos ou invisibilizados.
Nesse interim, meu projeto de pesquisa tem como intuito principal dar visibilidades aos afros brasileiros em distintos momentos históricos fazendo uma releitura das suas trajetórias de vida enfatizando como estes agiram em determinado contextos históricos. Além de dar protagonismo ao negro, este tem a intenção de auxiliar na identidade e empoderamento dos estudantes da escola básicas onde possam encontrar algo ou alguém que possa servir como representante positivo.
As consequências da escravidão como o racismo e a falta de planejamento para mobilidade econômica do povo negro nesse país ainda são latentes e são refletidas principalmente na escola. Logo, torna-se necessário uma abordagem educativa que seja mais significativa para os estudantes e que parta da realidade deste. Mesmo com o fim da escravidão negra as dificuldades são sentidas e o ensino de História tem esse papel de formar cidadão consciente que possam agir no mundo a fim de ratificar ou transformar sua realidade. Conforme salienta Monteiro:
...aprender História é aprender sobre nós mesmos. É aprender sobre a diversidade das experiências humanas através dos tempos e nos diferentes lugares. É aprender que o homem é o conjunto de suas práticas como sujeito, protagonista, e ao mesmo tempo sujeito à sua circunstância, no fazer da cultura.( 2005, p. 448)
“É comum ouvir a expressão “a história se repete”, entretanto, observa-se entre os diferentes historiadores que a história faz parte de um processo, como defende Ricouer 1997, e que por isso os acontecimentos do passado tendem a reaparecer pois eles não foram resolvidos em sua totalidade e fluem no presente como problemáticas persistentes. Com isso, emerge a necessidade de perscrutar um ensino de História que abarque as demandas do presente e que este façam sentido para os alunos. Esta é uma tendência atual da historiografia e da epistemologia do Ensino de História.
Carmen Anhorn 2010, aponta a necessidade que o professor de História tem em “dar sentido ao mundo em que vivemos, ou seja, selecionar conteúdos que sejam significativos ao aluno e que a condicionam a processos de ensino-aprendizagem que levem em conta a ‘realidade dos alunos’”. Ela aponta como solução para isso a ideia ancorada em Ricouer de pensar uma história em sua totalidade temporal partindo do presente, conforme especifica quando diz:
a possibilidade de pensar o passado está intimamente relacionada à possibilidade de pensar o futuro pela mediação do presente. Passado e presente só podem ser compreendidos na sua plenitude se inseridos numa extensão temporal que englobe igualmente o futuro, a noção de projeto ou, como afirma Ricoeur, a noção de “história por fazer” (Ricoeur apud Anhorn,1997,p.360).
A autora percebe o tempo como algo contínuo ou processual onde o passado sempre está no presente. Essa noção deve permear a escolha dos conteúdos ou os temas de sua sequencia didática:
Em relação aos critérios de seleção, a reelaboração didática da estrutura temporal do conhecimento histórico, a perspectiva aqui privilegiada exigiria que fossem formuladas questões que levassem em conta as demandas de cada presente onde essa história estivesse sendo ensinada, bem como as suas condições de produção. (Anhorn,2010,p.205)
Outra contribuição da autora foi a trazer a ideia defendida por Ricoeur de que o passado não está morto e acabado ele pode ser revisitado trazendo novas perspectivas novas possibilidades de releituras. “É preciso reabrir o passado, nele reviver potencialidades não realizadas, contrárias ou até massacradas” (1997, p.372). Isso é importante para o meu trabalho de pesquisa, pois historicamente o negro sempre esteve alijado como protagonista históricos.
Vários autores defendem a ideia do pressentimos de trabalhar a História partindo das demandas do presente como Koselleck e Hartog e Rüsen. Destaco o que diz Rüsen, quando fala sobre a Educação Histórica como método de ensino de historia e o objetivo a ser alcançado dentro desta perspectiva que ele designa como praxis:
“Quero tratar da ‘práxis’ como função específica e exclusiva do saber histórico da vida humana. Isso se dá quando, em sua vida em sociedade, os sujeitos têm de se orientar historicamente têm que formar sua identidade para viver – melhor: para poder agir intencionalmente. Orientação histórica para dentro (identidade) e para fora (práxis) – afinal é esse o interesse de qualquer pensamento histórico”. (RÜSEN, 2007, p. 87).
Esse projeto traz a possibilidade de trabalhar com diferentes temporalidades e sujeitos históricos resinificando suas trajetórias de vida de acordo com a necessidade do presente. Nesse aspecto Hartog faz essa proposta de a articulação de diferentes temporalidades:
“Eu entendo por regimes de historicidade os diferentes modos de articulação das categorias de presente, passado e do futuro. Conforme a ênfase seja colocada sobre o passado, o futuro ou o presente, a ordem do tempo, com efeito, não é a mesma. O regime de historicidade não é uma realidade acabada, mas um instrumento heurístico".(2007,p.16)
Keith Jenkins em seu livro a História repensada, 2001, nos traz importante contribuição teórica ao dirimir sobre o papel da história no construto das identidades. Importante para o afro brasileiro colocar em cena a imagem de um negro empoderado para minimizar essa identidade forjada de subalternidade na história. Enfim, o negro está onde ele deseja estar e o ensino de história deve contribuir para isso traçando novas estratégias pedagógicas.
Referências
HATORG, François. Tempos do Mundo, História, Escrita da História. In: GUIMARÃES, Manoel Luiz Salgado. (Org.) Estudos sobre a Escrita da História. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2007. p.16.
JENKINS, Keith. A História repensada. Tradução de Mario Vilela. Revisão Técnica de Margareth Rago. São Paulo, Contexto, 2001.
KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução de Wilma Patrícia Maas e Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro, Contraponto/Ed. PUC-Rio, 2006. (Capítulo 2: Historia Magistra Vitae: sobre a dissolução do topos na história moderna em movimento).
MONTEIRO, Ana Maria F. C. Ensino de História e história cultural: diálogos possíveis. In: Culturas políticas: ensaios de história cultural, história política e ensino de história. Organizadoras Rachel Soihet, Maria Fernand B. Bicalho e Maria de Fátima S. Gouvêa. Rio de Janeiro, Mauad 2005.
RÜSEN, Jörn. História viva: teoria da história: formas e funções do conhecimento histórico. Tradução de Estevão de Rezende Martins. Brasília, editora da UnB, 2007.
Bom dia Atila, fico surpreso quando digo aos meus alunos que povos africanos obtiveram grandes impérios (EX: Egito), e eles fazem aquela expressão de espanto como se o Egito não estivesse no Continente Africano. Quando falo sobre a dominação da península Ibérica pelos africanos também causa espanto. Isto também ocorre em suas aulas ou em seu cotidiano? Prof. Luciano Arantes Sanches
ResponderExcluirOlá, Átila. Criamos um Banners com a imagem de 30 personalidades negras com o título : E MUDARAM O MUNDO...
ResponderExcluirEntre as personalidades estão Zumbi, Chiquinha Gonzaga, Cartola, Mãe Menininha do Gantois, Barack Obama, Milton Santos, Tiger Woods, Bob Marcelo, Pele, Garrinchá, Lewis Hamilton, Nelson Mandela,entre outras personalidades negras que empoderam os alunos e alunas negros.
Gostaria de receber uma copia em PDF do Banner?
RENATO BARBIERI
rbarbieri66@gmail.com
Boa tarde com a criação das cotas em concursos, vestibulares, SISU, PROUNI, entre outros houve um consideravel aumento na auto declaração racial como negro (pardo,preto) Isso pode ser visto de forma positiva?(Kely Martins Cunha)
ResponderExcluirBoa noite Átila!
ResponderExcluirEu posso te dizer que o negro hoje nos livros didáticos de história, sistematicamente estão presentes nas ilustrações de Debret e Rugendas, a partir de uma visão eurocêntrica, factualista e presconceituosa em relação aos negros e negras e especialmente com a história da África. A questão da vulnerabilidade social também estigmatiza a imagem do negro nos livros didáticos.
Atenciosamente,
Bruno Sergio Scarpa Monteiro Guedes
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ResponderExcluirBoa noite Átila!
ResponderExcluirParabéns pelo artigo, trabalhar a perspectiva de África pela riqueza, impérios, grandes nomes da literatura é uma ótima forma de exaltação da sua cultura e quebra do estigma do povo negro perpetuado até mesmo nos livros didáticos.Criar novas estratégias pedagógicas é uma grande desafio como lidar com isso?
Boa tarde Átila Silva!
ResponderExcluirFiquei bastante interessado na sua temática, pois assim como os povos indígenas, os negros tiveram sua historia pormenorizada, achei muito interessante essa relação histórica que você fez entre os povos negros e a realidade da escola no nosso país, como consequência de uma falta de planejamento para esses grupos. Eu gostaria de saber como você faria, ou que tipo de práticas seriam interessantes para valorizar o ensino do povo negro dentro das escolas?
Atenciosamente
Jarmeson Melquiades Soares